A ascensão do Chega em concelhos marcados por pobreza, criminalidade, presença significativa de imigrantes e dependência de apoios sociais reflete um padrão observado em várias democracias europeias. Este fenómeno está enraizado em fatores socioeconómicos e percepções sociais que influenciam o comportamento eleitoral.
O Chega obteve votações expressivas em municípios com elevada percentagem de população estrangeira, como por exemplo Albufeira, Vila do Bispo ou Odemira. No Algarve, região com níveis de escolaridade baixos, pobreza acima da média nacional e mercado de trabalho caracterizado por sazonalidade e precariedade, o Chega conseguiu vitórias significativas. Quase um quarto da população algarvia tem nacionalidade estrangeira, e a falta de habitação adequada agrava as tensões sociais.
Os concelhos mais pobres, com mais criminalidade visível, mais população imigrante e mais dependência de apoios sociais são os que mostram maior receptividade a discursos securitários, nacionalistas e anti-sistema. Nessas zonas, há falta de oportunidades, serviços públicos precários, abandono escolar e um sentimento generalizado de impotência. O Chega aponta o dedo aos "responsáveis" - elites políticas, beneficiários de apoios considerados injustos, imigrantes, “bandidos que a polícia não pode prender”. As pessoas votam em quem parece falar a sua linguagem - sem filtros, sem rodeios. Ventura faz isso com eficácia. Mesmo quando os dados não mostram um aumento dramático da criminalidade, a percepção de insegurança é suficiente para gerar medo. Quando crimes ocorrem em zonas degradadas, especialmente envolvendo jovens estrangeiros ou minorias, o discurso do Chega encontra terreno fértil: promete “lei e ordem”, penas mais duras, polícia mais forte.
A esquerda, muitas vezes, evita o tema da segurança, com medo de parecer conservadora. E isso deixa o campo livre à extrema-direita. Não é que os eleitores do Chega vivam rodeados de estrangeiros, muitas vezes, bastam alguns casos mediáticos ou experiências diretas negativas. Em comunidades pobres, a concorrência por recursos escassos (casas, empregos, apoios) gera ressentimento: “eles recebem mais do que nós”, “nós trabalhamos, eles vivem dos nossos impostos”. O Chega explora esse ressentimento com habilidade, ao mesmo tempo que silencia os casos de imigração bem-sucedida. Zonas com elevado número de beneficiários do RSI (Rendimento Social de Inserção) tendem a gerar um ambiente ambíguo: Quem precisa do apoio sente-se estigmatizado. Quem não recebe acha que os outros estão a abusar do sistema. O Chega capitaliza esse mal-estar, propondo cortes, fiscalização apertada, e associando os apoios a "preguiça" ou "fraude". Mesmo sendo simplista, essa retórica ressoa com a frustração das pessoas comuns.
O sintoma social, que é a deriva do eleitorado para o Chega, usando uma metáfora médica, deve-se à doença civilizacional do Ocidente marcada por : stress crónico + retração empática = voto de protesto. Este artigo é a continuação do artigo neste blog do dia anterior sob o título "Stress crónico, retração empática e o voto de protesto: a ascensão do Chega como sintoma social". Tinha como ponto de partida um artigo de jornal de Helena Bento no Expresso online:《o consumo de medicamentos sem prescrição médica entre os jovens é uma preocupação crescente na Europa. Ansiolíticos e sedativos são os mais usados de forma indevida, seguidos dos analgésicos, revela o mais recente estudo “European School Survey Project on Alcohol and Other Drugs”. O relatório mostra ainda que o número de jovens que apostam online quase duplicou nos últimos cinco anos.》
O recente resultado das eleições parlamentares em Portugal: o Chega ultrapassar o Partido Socialista em número de deputados; e a extrema-esquerda sofrer um colapso eleitoral - não deve ser lido apenas como um realinhamento ideológico do eleitorado para a direita. Trata-se, acima de tudo de um sintoma social profundo que tem a ver com um crescente mal-estar emocional da sociedade em grande escala. O resultado do Chega não é nada desejável, mas é tudo menos surpreendente. Os sinais estão e estavam na realidade, mas foram e são desprezados pela atmosfera progressista que se respira na bolha mediática; uma atmosfera que coloca demasiados véus e biombos entre nós e a realidade, demasiados tabus, demasiados temas que não podem ser vistos e debatidos, demasiados temas que só podem ser debatidos de uma dada maneira.
O Chega cresce nestes tabus e silêncios. Muita gente não quis acreditar nas evidências. A esquerda ficou refém de políticas de identidade. A direita do Chega convocou para si esse ressentimento de classe que antes era da extrema-esquerda. Isto aconteceu noutros países, da França aos EUA: as zonas da esquerda saltaram para a extrema-direita. Estamos há uma geração na estagnação e isso obviamente gera um eleitorado zangado e desesperado por mudança. A grande fatia de eleitores do Chega não são “fascistas”, são pessoas desesperadas por melhores condições de vida, por uma possibilidade de esperança além desta estagnação.
No ocidente inteiro, o eleitorado clássico desta nova extrema-direita tende a ser mais pobre e menos letrado. As zonas do PCP e do PS eram as mais propensas a perder votos para o Chega, como está de facto a acontecer. A ideia de que o Chega ia ser sobretudo um problema para a AD e IL, o centro-direita, era um erro de quem vê a política olhando apenas para o parlamento, como se o parlamento fosse um jogo de xadrez isolado da sociologia do país. Sociologicamente, o eleitor do Chega está mais distante do eleitor AD/IL e está mais próximo do eleitor PS. O eleitor do PS tem menos rendimento e menos estudos do que o eleitor da AD (mais rendimento e mais educação) e por isso está mais próximo do retrato típico do eleitor do Chega. Há outro fator além do rendimento e dos estudos: de forma geral, os católicos resistem ao populismo.
Cada vez mais, a classe média tem procurado seguros de saúde e colégios privados, porque os serviços públicos defendidos pela esquerda degradaram-se e perderam qualidade agravada pela luta sindical com greves atrás de greves. Quem é que permanece nas escolas públicas? Os mais pobres e remediados, os mais propensos ao ressentimento do Chega. Os pais de alunos das escolas públicas estão saturados das greves nas escolas que tornam a sua vida num inferno. Idem para as greves nos transportes públicos. Estas greves, sempre protegidas pela esquerda, são um pasto para a raiva suburbana que alimenta o Chega. O instrumento da velha luta de classes da esquerda é agora um paradoxal e indireto instrumento da luta de classes do Chega. Os média também se silenciaram em relação a queixas das alentejanas em relação a imigrantes muçulmanos. Da mesma maneira, vimos como várias reportagens de fundo mostraram que de facto há problemas no Martim Moniz gerados pela imigração.
O recente resultado das eleições parlamentares em Portugal: o Chega ultrapassar o Partido Socialista em número de deputados; e a extrema-esquerda sofrer um colapso eleitoral - não deve ser lido apenas como um realinhamento ideológico do eleitorado para a direita. Trata-se, acima de tudo de um sintoma social profundo que tem a ver com um crescente mal-estar emocional da sociedade em grande escala. O resultado do Chega não é nada desejável, mas é tudo menos surpreendente. Os sinais estão e estavam na realidade, mas foram e são desprezados pela atmosfera progressista que se respira na bolha mediática; uma atmosfera que coloca demasiados véus e biombos entre nós e a realidade, demasiados tabus, demasiados temas que não podem ser vistos e debatidos, demasiados temas que só podem ser debatidos de uma dada maneira.
O Chega cresce nestes tabus e silêncios. Muita gente não quis acreditar nas evidências. A esquerda ficou refém de políticas de identidade. A direita do Chega convocou para si esse ressentimento de classe que antes era da extrema-esquerda. Isto aconteceu noutros países, da França aos EUA: as zonas da esquerda saltaram para a extrema-direita. Estamos há uma geração na estagnação e isso obviamente gera um eleitorado zangado e desesperado por mudança. A grande fatia de eleitores do Chega não são “fascistas”, são pessoas desesperadas por melhores condições de vida, por uma possibilidade de esperança além desta estagnação.
No ocidente inteiro, o eleitorado clássico desta nova extrema-direita tende a ser mais pobre e menos letrado. As zonas do PCP e do PS eram as mais propensas a perder votos para o Chega, como está de facto a acontecer. A ideia de que o Chega ia ser sobretudo um problema para a AD e IL, o centro-direita, era um erro de quem vê a política olhando apenas para o parlamento, como se o parlamento fosse um jogo de xadrez isolado da sociologia do país. Sociologicamente, o eleitor do Chega está mais distante do eleitor AD/IL e está mais próximo do eleitor PS. O eleitor do PS tem menos rendimento e menos estudos do que o eleitor da AD (mais rendimento e mais educação) e por isso está mais próximo do retrato típico do eleitor do Chega. Há outro fator além do rendimento e dos estudos: de forma geral, os católicos resistem ao populismo.
Cada vez mais, a classe média tem procurado seguros de saúde e colégios privados, porque os serviços públicos defendidos pela esquerda degradaram-se e perderam qualidade agravada pela luta sindical com greves atrás de greves. Quem é que permanece nas escolas públicas? Os mais pobres e remediados, os mais propensos ao ressentimento do Chega. Os pais de alunos das escolas públicas estão saturados das greves nas escolas que tornam a sua vida num inferno. Idem para as greves nos transportes públicos. Estas greves, sempre protegidas pela esquerda, são um pasto para a raiva suburbana que alimenta o Chega. O instrumento da velha luta de classes da esquerda é agora um paradoxal e indireto instrumento da luta de classes do Chega. Os média também se silenciaram em relação a queixas das alentejanas em relação a imigrantes muçulmanos. Da mesma maneira, vimos como várias reportagens de fundo mostraram que de facto há problemas no Martim Moniz gerados pela imigração.
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