quinta-feira, 17 de outubro de 2019

Capela de Rosslyn ou Catedral de Rosslyn



A Capela de Rosslyn ou Catedral de Rosslyn foi construída em 1446 em Roslin, Escócia. Foi fundada, por William Sinclair, 1º conde de Caithness, com o nome de Collegiate Chapel of St. Matthew. Diz a lenda que ela foi construída pelos Cavaleiros Templários para proteger o Santo Graal que, como se diz, está debaixo da rosa. Rosslyn é a rosa original, por isso a tal lenda. Quase tudo o que circula a seu respeito é pura fantasia, não contrariando o facto de a pequena igreja ao sul de Edimburgo dimanar uma atmosfera especial. Mas isso já é outra questão. A pedra de que é feita também se diz que é uma pedra especial, e os seus interiores são decorados por toda uma galeria de figuras enigmáticas, sem óbvia conotação cristã, uma iconografia rara e nalguns casos nunca vista noutros templos da época. O nome Rosslyn deriva da conjugação das palavras gaélicas para rocha e espuma de água, devendo-se à sua localização nas imediações do rio North Esk. Os rochedos desabaram ou foram retirados para construção, de modo que o rio já não é tão estrondoso. Mas o bosque que o rodeia é assim mesmo de uma beleza extraordinária.

Capela de Rosslyn passou a ter mais fama, e daí um crescimento brutal no número de visitas turísticas que passou a receber depois do "Código da Vinci" de Dan Brown publicado em 2003. Uma febre mística delirante baseada num outro livro publicado em 1982 - "O Sangue de Cristo e o Santo Graal" de um trio de esoteristas britânicos (Baigent, Leigh e Lincoln) - que estabelecia uma conexão até aí insuspeita entre a escocesa Rosslyn Chapel e a francesa Rennes-le-Château. A ligação reconduzia a Pierre Plantard, auto-intitulado Saint-Clair e líder do chamado Priorado do Sião. Autor de um extraordinário embuste, que começou como incentivo turístico para um hotel do sul de França. O Priorado do Sião apresentou-se como uma sociedade milenar, encarregue de proteger a linhagem secreta que teria começado na união carnal de Jesus e Maria Madalena. Maria Madalena teria vindo com uma família de elite judaica que aportou em Marselha e aí fizeram vida ao ponto de se continuarem pela dinastia Merovíngia, para chegar finalmente a Plantard. Uma vez que o apelido da família era o mesmo, Rosslyn teria também sido habitada por descendentes de Cristo e poderia muito bem guardar o Santo Graal ou outras preciosidades do género. Este esoterismo é alimentado por rios de prosa que circulam na internet aos milhões acerca de um outro mito ainda mais famoso, que é o dos Templários. Depois de milhões de livros vendidos em todo o mundo, que deu um bom dinheiro a ganhar a muita gente, veio o filme com Tom Hanks, que durante uma semana assentou arraiais em Roslin para as rodagens do filme. Apesar das multidões e das restrições nas visitas, o sítio continua a exalar uma aura extraordinária, que se torna mais vincada quando se conjuga com a visita do vizinho castelo de Roslin.

Rosslyn foi, na verdade, a terceira capela edificada na propriedade da família Sinclair, descendente de cavaleiros normandos. Havia a capela do castelo, a do cemitério e finalmente esta fundada por William, Príncipe de Orkney, que a projectou como parte de uma igreja mais ampla de planta em cruz, chamada Collegiate Church of St Matthew The Apostle. As igrejas colegiais eram uma moda na época - só na Escócia havia umas 40 - e consistiam em ter um colégio de padres e meninos de coro, incumbidos de diariamente sagrarem missa e rezarem pelas almas dos proprietários e seus familiares (que nessa medida se consideravam melhor colocados para subirem aos céus). Constando ser atravessada pelo meridiano de Paris, contém uma cripta "secreta" com centenas de blocos de pedras salientes e um texto codificado. Cada bloco é esculpido com um símbolo, aparentemente sem uma ordem, mas criando um código, que os criptógrafos modernos nunca conseguiram decifrar. Mais recentemente ultra-sons geológicos revelaram a presença de um enorme subterrâneo abobadado, escondido por baixo da capela. Essa cave parece não ter entrada nem saída. Até hoje os curadores da capela não permitiram escavações. 

Os trabalhos devem ter arrancado por volta de 1456, mas Sir William faleceu entretanto e o filho não quis ou não pôde desenvolver a igreja, limitando-se a mandar colocar um telhado sobre a capela do coro, onde o pai foi enterrado. Daí a exiguidade do templo de 20 metros de comprimento, dez de largura e doze de altura. A Reforma da Igreja Escocesa obrigou à destruição do altares e das figuras de santos católicos, em 1560, e obviamente ao encerramento da capela como lugar de culto público. Desde aí Rosslyn escapou mais ou menos intacta aos ventos da história, sendo inclusive renovada - altar novo, vitrais, substituição de pedras quebradas) e reaberta em 1861 pela Igreja Escocesa Episcopal, que nela continua hoje a celebrar culto, apesar da crescente pressão turística.




Rosslyn pode ser pequena, mas para onde quer que o visitante se volte descobre esculturas fantásticas e enigmas a condizer. Uma das atracções maiores é o conjunto de 213 caixas que se destacam de arcos e pilares, cada um esculpido com o seu próprio padrão. A equipa formada por Thomas e Stuart Mitchell, pai e filho, investigou a semelhança deste conjunto escultórico com os padrões produzidos por corpos em vibração, mais conhecidos por ondas Chladni. E assim produziram uma melodia chamada Rosslyn Motet. É engenhoso, mas pouco convincente. Que podia levar os arquitectos medievais de gravar essa ou, na verdade, qualquer outra melodia na pedra? A peça mais famosa da capela é um quebra-cabeças. Trata-se do Pilar do Aprendiz, um dos três que se erguem na sua ponta oriental (são 14 no total). Cada um desses três pilares recebeu o nome de um grau do progresso maçónico, algures no século XVIII, mas há qualquer coisa que não bate certo quando o pilar mais artisticamente elaborado não é o do Mestre mas o do Aprendiz. A lenda reza que o pedreiro encarregue de executar o pilar achou o desenho de tal modo complicado que primeiro quis ir a Roma ver o original, tempo entretanto aproveitado pelo aprendiz para realizar a obra. Resultou numa obra-prima, o que deixou o mestre cheio de inveja, levando-o a dar o castigo máximo ao aprendiz, cuja cabeça rachou ao meio. O próprio pilar exibe um apuro artístico realmente só ao alcance de um mestre-pedreiro. Mais pacífica é a teoria segundo a qual o Pilar do Aprendiz é uma declinação do mito norueguês de Yggdrasil, a Árvore do Conhecimento, tal como era sustentado por um colar de dragões, de cujas bocas saem os ramos que se vão entrelaçando em torno da coluna. Esta semelhança parece também reforçada pela ligação dos Sinclair a Orkney e aos antecedentes noruegueses desta ilha escocesa.



Muito discutidas são também as esculturas de plantas, que foram identificadas com milho e aloé vera, apesar de desconhecidas na Europa na altura da construção da capela. Daí se conjecturar que essas representações vegetais eram uma prova de que os escoceses, em particular Henry Sinclair I, avô de William, teria estado secretamente do outro lado do Atlântico muito antes de Colombo lá chegar. Os especialistas consideram, porém, que estas esculturas são demasiado estilizadas para justificarem conclusões tão inusitadas. Mais provável é tratar-se de representações grosseiras ou descaracterizadas pelo tempo de plantas bem mais familiares.

Há ainda a colecção de mais de uma centena de Homens Verdes (cabeças de homens envolvidas por folhagem), iconografia que se sabe ter uma raiz pré-cristã e também se encontra noutras igrejas medievais, nomeadamente na Catedral de Glasgow. Seriam um produto da época, mas o que mais recentemente se veio a apurar é que a colecção de Homens Verdes de Rosslyn forma uma sequência representando o ciclo das estações (e da vida) desde a Primavera com as cabeças joviais e sorridentes a oriente, até ao Inverno e às cabeças-esqueleto da ponta ocidental da capela.



A profusa decoração da capela justifica, mas está longe de esgotar a extraordinária reputação mística de Rosslyn. A cripta onde ninguém entra há séculos e um cem número de pistas enigmáticas são tão ou mais apelativos. Entramos no domínio do que não se vê, ou não se pode inferir do que se vê, mas que por isso mesmo arrasta multidões. Logo a começar pelo tema recorrente em todos os falatórios: a famosa cripta, onde os Sinclair se fizeram enterrar durante séculos, vestidos a rigor de armas e armaduras.

Há uma carta datada de 1546, enviada por Marie de Guise, regente da Escócia e mãe da célebre Maria, Rainha da Escócia, a um outro William Sinclair, respeitante a um "Segredo" que importa ser guardado. Podia ser uma arca cheia de jóias que na altura se dizia ter desaparecido do paço real escocês, mas é esquisito a regente falar em "Segredo" com letra maiúscula e comprometer-se a ser fiel ao súbdito, quando era suposto ser ele a declarar-lhe fidelidade. Seria algo bem mais valioso, sustentam os místicos, certamente algo mais do que riquezas materiais - qualquer coisa como o Santo Graal, a cabeça de Jesus ou papiros secretos, revelando detalhes da vida de Cristo.

As hipóteses convergem na tese de Rosslyn ter sido um bastião Templário, ordem religiosa que chegou a ser favorecida pela coroa escocesa, construindo o seu quartel-general em Balantrodoch, agora Temple, a dois passos de Rosslyn. A ordem foi dissolvida na Escócia em 1307, mas há quem acredite que depois disso passou à clandestinidade, guardando os seus tesouros religiosos nas profundezas da capela vizinha. Chegados ao século XVIII, o quarto conde Sinclair foi declarado Grande Mestre Maçon na altura em que a Maçonaria se assumiu publicamente na Escócia, sugerindo que a família já detinha esse cargo em segredo, a título hereditário. Os Sinclair seriam, portanto, o elo perdido entre os Templários e a Maçonaria.

Resta a atmosfera especial que se respira na secular propriedade dos Sinclair. Na capela, mas também no castelo de Roslin, muito menos visitado do que ela (fica longe da estrada, não há placas a indicar o caminho, o castelo não se vê da capela). Construído em 1330, no sítio em que uma pequena força escocesa venceu uma enorme tropa inglesa, o castelo foi edificado no alto de um promontório, protegido a três quartos por uma vala profunda. Isso não impediu que fosse várias vezes destruído (pelas armas, mas também pelo fogo) e reconstruído. O que se vê agora resulta da última intervenção em finais do século XVI. Impressiona a ponte de pedra que lhe dá acesso sobre o abismo, a ruína do antigo portão à entrada, o edifício de cinco andares construído a toda a altura do promontório, ainda emoldurado por grossas muralhas defensivas. Também aqui há lendas que falam de um tesouro escondido nas caves, guardado por uma formosa dama adormecida. E que um conde italiano foi lá desencantar uma preciosa história da Escócia, desde então guardada a sete chaves na Biblioteca do Vaticano.

Sem comentários:

Enviar um comentário