terça-feira, 3 de setembro de 2024

Tradições da Índia e da China do século VI a.C.


Na Índia, o Samkhya, é uma das seis escolas clássicas de filosofia que terá surgido provavelmente no século VI a.C. É uma das mais antigas e influentes tradições filosóficas do hinduísmo. O Samkhya é uma escola dualista que distingue claramente duas realidades fundamentais: Purusha (o espírito ou o ser consciente) e Prakriti (a matéria ou natureza primordial). Segundo o Samkhya, o universo é o resultado da interação entre Purusha e Prakriti. A filosofia Samkhya procura compreender a natureza da existência e como a libertação (moksha) do ciclo de nascimento e morte (samsara) pode ser alcançada. Embora o Samkhya seja uma filosofia bastante antiga, suas ideias influenciaram outras tradições indianas, como o ioga, que adota e adapta muitos conceitos Samkhya na busca pelo controlo da mente e do corpo para atingir a iluminação.

Insatisfeitos com os Upanushades, os filósofos indianos buscavam um maior conhecimento do seu interior, uma filosofia ateísta. A insatisfação com os Upanixades, que são textos filosófico/religiosos ligados aos Vedas, levou alguns filósofos indianos a buscar um entendimento mais profundo da natureza do ser e da realidade. Isso contribuiu para o desenvolvimento de filosofias que exploravam o conhecimento interior de maneira mais racional e sistemática, incluindo abordagens que poderiam ser consideradas ateístas.

A escola Samkhya não atribui a criação do mundo a uma divindade, mas sim à interação entre Purusha (o espírito) e Prakriti (a matéria). O Samkhya enfatiza a busca do autoconhecimento para alcançar a libertação (moksha) sem a necessidade de intervenção divina. Outra escola relevante é o Jainismo, que também é uma filosofia ateísta. O Jainismo nega a existência de um criador supremo e se concentra na purificação da alma por meio da não violência (ahimsa) e da disciplina ética. Essas tradições filosóficas refletem a diversidade do pensamento indiano antigo, que oferecia diferentes caminhos para a compreensão da realidade e da liberação espiritual, alguns dos quais não dependiam da crença em deidades.

Buda introduziu a prática da meditação como uma ferramenta fundamental para entender e transformar a mente. Ele acreditava que a causa do sofrimento e, por extensão, da violência, estava nas aflições mentais como a avareza, a raiva e a ignorância. Buda propôs o Nobre Caminho Óctuplo como um guia para a vida ética e mentalmente saudável. Este caminho inclui práticas de correção: fala; ação; meditação - todas destinadas a cultivar uma mente pacífica e compassiva. Através da meditação e da introspecção, Buda ensinou a compreender as causas do sofrimento (dukkha) e a superar esses estados mentais negativos, promovendo uma vida de não violência (ahimsa).

Era a exploração de um domínio desconhecido: Psique Humana. Foco na introspecção e na meditação, é o começo da exploração da mente humana. Em grande parte, são métodos inovadores para sua época. A procura das raízes internas do comportamento humano através de métodos de transformação. 
A abordagem de Buda, voltada para a interioridade, sugeriu que a mudança social e a redução da violência começam com a transformação interior do indivíduo. Esta ideia de que a paz externa está ligada à paz interna continua a ser uma base fundamental em muitas filosofias e práticas espirituais até hoje.

Na China, o século VI a.C. era atravessado por muita penúria, mas via nascer Kong Qiu, mais conhecido por Confúcio. O tempo do grande pensamento na China estava a chegar. No século VI a.C., a China passava por um período de grande turbulência e penúria, conhecido como o Período das Primaveras e Outonos (770–476 a.C.). Nesse contexto de instabilidade política, social e moral, surgiu uma das figuras mais influentes da história chinesa. Confúcio nasceu por volta de 551 a.C., numa época em que a China estava fragmentada em pequenos estados em constante conflito. As dificuldades e a corrupção generalizada inspiraram Confúcio a buscar formas de restaurar a ordem e a harmonia na sociedade. Ele desenvolveu um sistema de pensamento que enfatizava a moralidade, a ética e a importância das relações sociais, que mais tarde se tornaria conhecido como Confucionismo.

Confúcio acreditava que a chave para uma sociedade justa e harmoniosa estava na virtude dos governantes e na educação moral do povo. Ele defendia a importância da ren (benevolência ou humanidade), li (ritos ou normas sociais), e xiao (piedade filial), entre outros princípios, como fundamentos para o comportamento humano e para a forma de governar. O surgimento de Confúcio e o desenvolvimento do Confucionismo marcaram o início de uma era de grande reflexão e pensamento na China, que influenciou profundamente a cultura, a política e a filosofia chinesa por séculos. Seu legado se tornou um dos pilares da civilização chinesa, moldando a ética e o comportamento social da China e de outras partes da Ásia.

Confúcio, ao contrário de muitos outros pensadores da sua época, não era um asceta solitário que rejeitava os prazeres mundanos. Embora ele valorizasse a virtude, a moralidade e a vida ética, ele também acreditava que era perfeitamente aceitável desfrutar das coisas boas da vida, desde que feito com moderação e em harmonia com os valores morais. Confúcio defendia a ideia de que a vida virtuosa não exigia a renúncia total aos prazeres, mas sim a busca de um equilíbrio. Ele acreditava que o prazer poderia fazer parte de uma vida equilibrada e que o desfrute de boa comida, música e companhia agradável poderia contribuir para o bem-estar humano, desde que essas atividades não levassem ao excesso ou à negligência das responsabilidades

Essa visão de Confúcio reflete a crença de que a virtude está no meio termo — uma ideia de que ele aplicava tanto à ética quanto à vida quotidiana. Ele acreditava que o verdadeiro sábio é aquele que sabe apreciar as boas coisas da vida sem se deixar dominar por elas, mantendo sempre a moderação e a retidão moral. Um exemplo dessa abordagem equilibrada é sua atitude em relação à música. Confúcio era um grande apreciador da música e acreditava que ela tinha um papel importante na educação moral e na formação do caráter. Ele via a música como uma forma de cultivar a harmonia interior e de expressar emoções de maneira controlada.

Os Analectos ( Lunyu em chinês) são uma coleção de ditos e ideias atribuídos a Confúcio, compilados por seus discípulos após a sua morte. Este texto é uma das principais fontes de conhecimento sobre o pensamento confuciano e tem sido fundamental para a compreensão da filosofia de Confúcio ao longo dos séculos. Confúcio não deixou escritos próprios; em vez disso, seus ensinamentos foram transmitidos oralmente e foram registados por seus seguidores. Os Analectos reúnem essas lições em forma de diálogos curtos, reflexões e aforismos. Eles abordam temas variados, como ética, governança, educação, moralidade e as relações humanas, refletindo a ênfase de Confúcio na importância da virtude, da educação e da harmonia social. O trabalho de compilar os Analectos provavelmente começou pouco depois da morte de Confúcio, em 479 a.C., e pode ter levado várias décadas para ser concluído. Embora existam debates sobre a datação exata e a autoria dos diferentes capítulos, os Analectos se tornaram uma obra central para o confucionismo e têm sido estudados e venerados por gerações de estudiosos na China e em toda a Ásia. Pela via dos Analectos, os ensinamentos de Confúcio tiveram uma influência duradoura, moldando não apenas a filosofia, mas também as práticas sociais e políticas na China.

A morte de Yan Hui foi um evento profundamente triste para Confúcio. Yan Hui, um dos discípulos mais queridos e talentosos de Confúcio, faleceu prematuramente, o que deixou Confúcio desolado. Yan Hui era conhecido por sua humildade, dedicação ao estudo e profundo entendimento dos ensinamentos de Confúcio. Ele era considerado o discípulo mais promissor e o que mais se aproximava do ideal confuciano de virtude e sabedoria. Confúcio tinha grande afeição por ele e frequentemente elogiava a sua conduta e caráter. Quando Yan Hui morreu, Confúcio expressou a sua dor e tristeza de forma intensa. Nos Analectos há passagens que mostram o quanto Confúcio sofreu com essa perda. Ele teria dito: "O Céu me destruiu! O Céu me destruiu!" (Analectos, 11:9), refletindo a sua profunda aflição. Confúcio também lamentou que, com a morte de Yan Hui, perdeu alguém que realmente compreendia os seus ensinamentos e que era capaz de praticá-los plenamente. A morte de Yan Hui foi um golpe duro para Confúcio, não só por causa da proximidade emocional que ele sentia, mas também porque ele via em Yan Hui a esperança de que seus ensinamentos seriam preservados e transmitidos para as gerações futuras. A dor de Confúcio pela perda de seu discípulo mais amado é um dos momentos mais humanos e comoventes registados nos Analectos.

Confúcio e Buda, através de suas respectivas tradições, abriram caminhos significativos para a compreensão da violência e da conduta humana, focando a necessidade de autodomínio, meditação e introspecção. Suas contribuições ajudaram a moldar a maneira como pensamos sobre a ética, a moralidade e a transformação pessoal, tendo um impacto duradouro nas práticas filosóficas e espirituais ao longo dos séculos.

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