quinta-feira, 5 de junho de 2025
A "imagem de si" e a consciência reflexiva
Além de sabermos que estamos vivos, e se nos sentimos bem ou mal, refletimos sobre esse estado. Esse movimento, segundo Damásio, é uma das grandes inovações cognitivas que surgiram na espécie humana e que nos permite pensar sobre nós mesmos e planear as nossas ações com base nesse entendimento. As emoções são essenciais nesse processo de consciência. Elas são o que dão significado aos nossos estados corporais, associando informação do corpo invadido por emoções. Isso nos ajuda a navegar o mundo e a tomar decisões. Não existe racionalidade sem que ela seja moldada pelas emoções, já que são elas que nos informam sobre o que é importante ou relevante.
A consciência humana é um dos maiores mistérios da neurociência e da filosofia, e o trabalho de Damásio sobre o sentimento de si oferece uma contribuição essencial para entendê-la de uma maneira mais integrada e complexa. Ele desafia muitas concepções tradicionais e nos convida a repensar o "eu" como um fenómeno dinâmico e não uma estrutura fixa ou pré-determinada. Damásio não vê a consciência como algo estático ou linear, mas como um processo contínuo e em constante adaptação, que resulta de um fluxo interativo entre o cérebro, o corpo e o ambiente. A consciência de si mesmo não aparece de forma instantânea ou unificada. Ao contrário, ela se constrói ao longo do tempo por meio de sensações corporais, emoções e memórias, que são processadas constantemente pelo cérebro.
A autoconsciência é, basicamente, a percepção primária de si. A sensação de que o nosso corpo está vivo, funcionando, e em interação com o mundo. Essa consciência primária é automática, rápida e muitas vezes inconsciente. Não precisamos pensar conscientemente sobre o batimento do nosso coração ou a respiração, mas sabemos que estão acontecendo, pois nosso cérebro mantém uma representação contínua dessas funções corporais.
Já a consciência reflexiva é a capacidade de pensar sobre si mesmo, refletir sobre a nossa existência e nosso lugar no mundo. Damásio argumenta que essa forma de autoconsciência não é algo natural e imediato, mas surge com o tempo, e está intimamente ligada à capacidade do ser humano de refletir sobre suas experiências e aprender com elas. Ao contrário da visão cartesiana, que via as emoções como algo que obscurece a razão, Damásio argumenta que elas são essenciais para a racionalidade. As emoções ajudam a tomar decisões, ajustam nossa percepção do mundo e conectam-nos à nossa realidade interna e externa.
O cérebro, por meio do córtex pré-frontal, tem a capacidade de regular essas emoções, e não podemos funcionar de maneira eficiente sem essa interação contínua entre emoção e razão. O impacto dessa nossa percepção do mundo contribui para a construção do "eu", que nos permite ter uma experiência contínua de ser quem somos, apesar das transformações por que passamos. Ao mesmo tempo, reconhecemos que somos diferentes a cada momento, em termos físicos, emocionais e cognitivos.
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