Para o cérebro humano, as competições desportivas são percebidas como "batalhas" simbólicas. No nosso passado evolutivo, a pertença a um grupo vencedor era decisiva para o acesso a recursos e à chance de reprodução. Ou seja, ganhar aumentava o prestígio do indivíduo e do grupo, e isso tendia a elevar a testosterona. Esta hormona está ligada à motivação, domínio, e, por conseguinte, à competitividade. Mesmo hoje, quando um adepto vê o seu clube vencer, o cérebro reage como se ele próprio tivesse vencido. É o que os estudos mostram. Após uma vitória da equipa, os níveis de testosterona dos adeptos (especialmente dos homens) aumentam, enquanto uma derrota, que transmite um efeito de submissão, pode fazer o oposto: baixar esses níveis. Isso é chamado de efeito de vitória -- winner effect.
Essa foi a progressão evolutiva da espécie com a identificação tribal. Torcer por uma equipa de futebol é como pertencer a uma "tribo" em competição com outra. E os circuitos cerebrais que regulam a agressividade, a lealdade de grupo e o orgulho são profundamente ativados nesses contextos.
Há um estudo clássico publicado em 1998, liderado por Bernhardt, sobre os adeptos do Mundial de Futebol de 1994, realizado pela primeira vez nos Estados Unidos da América, e em que pela 4ª vez se sagrou campeão o Brasil. O que fizeram? Pois mediram os níveis de testosterona em adeptos norte-americanos durante o jogo dos EUA com o Brasil. Nos adeptos dos EUA, que perdeu, a testosterona caiu significativamente após a derrota. Em 2003 foi feito um estudo no rugby entre ingleses durante jogos importantes. Após vitórias, a testosterona dos adeptos subiu. Após derrotas, desceu. E essa descida era proporcional à importância emocional atribuída ao jogo. O que descobriram foi que o chamado efeito de vitória é observado tanto em quem compete diretamente como em quem apenas observa, os adeptos. Curiosidade: Até nos jogos de xadrez de alto nível, as flutuações de testosterona foram registadas! Um estudo recente em adeptos de clubes espanhóis mostrou que, em clássicos como Real Madrid // Barcelona, as flutuações hormonais eram mais fortes nos jogos de maior rivalidade, indicando que o grau de envolvimento emocional amplifica o efeito.
Os mecanismos cerebrais por trás disso são os seguintes: O futebol ativa áreas cerebrais ligadas à recompensa (como o núcleo accumbens). Ganhar "reforça" a identidade social e o estatuto, o que biologicamente aumenta a testosterona. Perder ativa áreas ligadas à dor social (como a ínsula anterior), o que deprime essa resposta hormonal. Estes efeitos são mais visíveis em homens, mas também existem nas mulheres, sobretudo as que frequentam os estádios, embora um pouco diferente.
Quando a testosterona sobe, isso não é apenas uma mudança física, ela influencia o comportamento social do adepto de forma bastante concreta, aumentando a extroversão e a exuberância após uma vitória. Os adeptos tendem a ficar mais expansivos, falando alto, gritando, cantando, abraçando desconhecidos. Isso acontece porque a testosterona alta reduz a inibição social e aumenta a sensação de poder e pertencimento ao grupo. Muitas vezes vemos comportamentos como invadir o campo, fazer cortejos na rua, gastar dinheiro em bares e restaurantes. Em nada há almoços grátis, como quando as coisas descambam para maior agressividade. Embora a maioria dos adeptos apenas celebre de forma positiva, em algumas situações, a testosterona elevada pode também aumentar a agressividade, em que os confrontos entre adeptos rivais é paradigma.
Antropologicamente, isso é comparável a "festas de vitória" nas tribos antigas, em que bebidas fermentadas eram usadas para comemorar conquistas. Curiosamente, há dados que mostram que homens mesmo apenas por torcer pela equipa vencedora são percebidos como mais atraentes socialmente depois da vitória. As mudanças hormonais e a atitude confiante contribuem para isso. É como se o "cheiro da vitória" ainda tivesse algum efeito evolutivo. O impulso biológico é semelhante em todo o mundo -- aumento da testosterona após uma vitória. Nem a maneira como a cultura molda o que é "aceitável" ou "esperado" consegue mudar completamente o comportamento orquestrado pelas hormonas.
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