sexta-feira, 20 de junho de 2025

Jacques Monod



Jacques Monod é uma figura fascinante, seja pela sua importância científica, seja pela profundidade filosófica da sua obra. Vamos explorar três dimensões principais do seu pensamento, com destaque para o livro -- Le Hasard et la Nécessité (1970) -- uma das obras mais influentes do século XX na filosofia da biologia. Jacques Monod (1910–1976), bioquímico francês, foi um dos fundadores da biologia molecular moderna. Prémio Nobel em 1965 com François Jacob e André Lwoff pelos seus estudos sobre a regulação genética em bactérias, especialmente o modelo do operão (lac operon). Contribuição essencial: demonstrou que os genes são ativados ou silenciados por moléculas reguladoras, num verdadeiro “sistema de comutação”. Isso mostrou que a expressão génica depende de sinais externos, antecipando a ideia de que o genoma é interpretado pela Natureza, não simplesmente executado.

A mutação genética é mesmo aleatória (hasard), e não dirigida. As leis da física e da química é que são necessárias (nécessité). Necessidade no sentido filosófico, que é determinista. Numa tradução para vernáculo diria que é o que é viável, o que ter de ser. A evolução é cega, sem finalidade, sem sentido prévio. O ser humano surgiu como podia não ter surgido. Na escala cósmica a espécie humana obedece à mesma aleatoriedade de todas as outras espécies, milhões de espécies, cuja forma é circunstancial de acordo com leis deterministas e acasos evolutivos dos ecossistemas. Monod rejeita qualquer forma de teleologia (finalismo) na Natureza. Isso o leva a um tipo de existencialismo científico, próximo de Camus e Sartre. Num contraste entre Jacques Monod, Stephen Jay Gould e Richard Dawkins, três gigantes da biologia evolutiva, todos influenciados pelo darwinismo, podemos confrontar visões bem distintas sobre o papel do acaso, da necessidade, da finalidade e até da consciência humana.

Stephen Jay Gould (1941–2002) concordava com Monod quanto à aleatoriedade da evolução, mas dava um passo adiante com a sua ideia de contingência histórica: “Se rebobinássemos a fita da vida, e a puséssemos a correr de novo, o resultado seria completamente diferente.” O acaso age não só nas mutações, mas também nos eventos macroscópicos. No acaso cabem extinções em massa, colisões de asteroides, climas extremos. A vida evolui por saltos descontínuos (punctuated equilibrium), e não de forma suave e gradual. A evolução não tende à complexidade: a consciência humana poderia nunca ter surgido. Somos um entre milhões de possíveis caminhos. Gould não alinha na finalidade, no propósito, mas é muito mais histórico que Monod: ele insiste que a trajetória evolutiva não é única, mas é irrepetível. Podia ser diferente, mas nunca voltaria a ser da mesma maneira, se fosse repetida. Não é bem como uma biografia, mas como uma pluralidade de histórias possíveis de vida.

Richard Dawkins (n. 1941), por outro lado, vê a evolução como um processo altamente eficiente e acumulativo, conduzido por uma lógica quase de engenharia. A mutação para ele também é aleatória, mas a seleção natural é sistemática: como um algoritmo que descobre, testa e mantém as melhores adaptações. O verdadeiro protagonista não é o organismo, mas o gene: os corpos são “máquinas de sobrevivência” construídas pelos genes para se replicarem (O Gene Egoísta, 1976). Todas as suas ideias nesta altura já foram ultrapassadas pelos pontos de vista opostos. O gene não é egoísta. É cego. A forma, ou o fenótipo, fica por conta da epigenética. E a epigenética é a Natureza a trabalhar por fora dos genes.


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