segunda-feira, 2 de junho de 2025

As correntes migratórias na Europa


Nos anos 1960 deu-se um boom migratório sobretudo para a França e Alemanha, que ainda se prendia com as sequelas da guerra na Europa. Era a reconstrução económica do pós-guerra. Esse fluxo migratório foi impulsionado por vários fatores. A economia europeia crescia rapidamente, exigindo uma grande quantidade de mão de obra, especialmente para indústrias e setores como construção civil e manufatura. Espanha também ainda sofria das feridas deixadas pela Guerra Civil [1936-1939]. Muitos homens europeus haviam morrido na guerra, e a mão de obra disponível não era suficiente para sustentar a reconstrução e a expansão económica.

Países -- como a Alemanha Ocidental (RFA) e a França -- assinaram acordos de trabalho com vários países: nações do sul da Europa (Itália, Espanha, Portugal, Grécia); ex-colónias e países do Magrebe (Argélia, Marrocos, Tunísia). Após a independência de muitas colónias africanas e asiáticas, houve um aumento migratório para as metrópoles, especialmente para França e Reino Unido. No caso francês, a guerra da Argélia (1954-1962) também deslocou centenas de milhares de pied-noirs (europeus nascidos na Argélia) e harkis (argelinos que lutaram ao lado da França).

Na Alemanha Ocidental, a política de contratos temporários de trabalhadores por convite, deslocou milhões de imigrantes, principalmente da Turquia e da Itália. Portanto, a expectativa, era que esses trabalhadores retornassem aos seus países de origem após alguns anos. Mas muitos acabaram por ficar. Esse processo mudou a composição demográfica da Europa. E assim se lançaram as bases para o debate -- integração, identidade nacional e multiculturalismo -- que se intensificou nas décadas seguintes.

Muita imigração entrou clandestina. Além da imigração oficial por meio de acordos bilaterais e programas de trabalhadores convidados, houve também um fluxo significativo de imigração clandestina para esses países nos anos 1960. Estabeleceram limites, mas a necessidade real de força de trabalho era maior, especialmente em setores de baixa qualificação: construção civil; indústria fabril; serviços domésticos. Isso levou empregadores a recorrerem a imigrantes sem documentação. Embora houvesse controlos fronteiriços, eles não eram rigorosos. Além disso, a livre circulação dentro da Europa já começava a ser uma realidade em algumas regiões, o que facilitava a mobilidade dos imigrantes. A independência de países da África e da Ásia levou muitas pessoas a buscar melhores condições de vida na Europa. Muitos imigrantes das ex-colónias entraram de maneira irregular, seja por dificuldades em obter vistos, seja por falta de políticas claras de recepção. Com o crescimento das comunidades de imigrantes, na França e na Alemanha, geraram-se redes de apoio, o que facilitou a entrada de mais gente sem documentação.

Nos anos 1970, com a crise do petróleo e o aumento do desemprego, muitos países europeus começaram a endurecer as suas políticas migratórias, restringindo a entrada de novos imigrantes e tentando regularizar ou expulsar aqueles que já estavam no continente. No entanto, a imigração clandestina nunca cessou completamente e continuou a ser um tema central nos debates políticos europeus. Daí que a discrepância entre a expectativa e a realidade era enorme. As estatísticas oficiais não batiam certo com as percepções. Os olhos dos cidadãos europeus contavam outra história. O que inicialmente foi projetado, uma imigração temporária com retorno ao ponto de partida, a realidade acabou por ser muito diferente. 

A discrepância entre os números oficiais e o que os cidadãos viam no dia a dia gerou tensões políticas e sociais que ainda ecoam na Europa contemporânea. Os governos calcularam que a imigração seria limitada e predominantemente composta por trabalhadores que retornariam aos países de origem após alguns anos. No entanto, muitos acabaram por ficar, trazendo familiares e formando comunidades duradouras. O número de imigrantes que entraram clandestinamente e permaneceram sem documentação foi difícil de rastrear. Muitos trabalhavam no setor informal, escapando dos registos oficiais. Isso gerou uma discrepância entre os dados do governo e a percepção pública.

Embora a porcentagem total de imigrantes na população europeia fosse relativamente baixa nos anos 1960 e 1970, a concentração em bairros específicos de grandes cidades, como Paris, Marselha, Londres e Berlim, deu a impressão de que eram muito mais numerosos do que os registos sugeriam. Isso ficou conhecido pelo grande impacto visual da concentração urbana. Com o passar dos anos, a imigração deixou de ser apenas laboral. O reagrupamento familiar aumentou o número de imigrantes, e suas taxas de natalidade geralmente eram mais altas do que as da população nativa, ampliando a percepção de crescimento.

Seja como for, os trinta anos, que se seguiram ao fim da Segunda Guerra Mundial, foram anos gloriosos de prosperidade. E a prosperidade é um calmante de tensões sociais. Mas com a crise do petróleo de 1973, e o aumento do desemprego, a presença de imigrantes passou a ser vista com desconfiança, pois os imigrantes, antes bem-vindos como trabalhadores, passaram a ser vistos como competidores por empregos e benefícios sociais. Muitos europeus sentiram que os governos não estavam a ser transparentes ou eficazes na gestão da imigração. Isso levou à ascensão de Partidos Nacionalistas. E Movimentos anti-imigração começaram a ganhar força, questionando a política migratória e o impacto na identidade cultural dos países. 

Todo esse retrocesso nas boas expectativas de bem-estar e paz social empurrou os imigrantes para a periferia das cidades em bairros concentrados como guetos. Ora isso foi o cadinho de tensões sociais com os agentes da segurança e os episódios de violência urbana foram crescendo exponencialmente. O que começou por ser uma necessidade económica, transformou-se num barril de pólvora social. Os debates intensificaram-se até hoje, estando à vista de todos os seus efeitos mais marcantes: a ascensão da extrema-direita nacionalista.

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